No início do século XX, a possibilidade de difusão massiva do automóvel tornou-se um facto.
A velha carroça deu origem à carroceria e os cavalos batizaram as novas e muito superiores capacidades de tração dos motores.
As linhas de montagem em série surgiram.
A dimensão das carrocerias foi calculada para a família rural americana – a principal utente de carroças – em média com cinco elementos.
A sua principal utilização era a deslocação semanal ao mercado da vila mais próxima, para abastecimento de bens de consumo corrente. Para transporte destes, foi concebido um amplo compartimento na traseira do veículo.
E, claro, um motor capaz de movimentar toda esta carga à “louca” velocidade de 40km/hora.
A cultura desta conceção de automóvel generalizou-se e as décadas seguintes assistiram a evoluções técnicas e estéticas assinaláveis porém, sempre conservadoras nos conceitos básicos originais.
A apetência generalizada das pessoas para essa nova e atraente forma de libertação das limitações individuais, o conforto proporcionado, a vertigem da velocidade, a exploração de novas paisagens tornou a viatura uma tão indispensável quanto comum, ferramenta para as sociedades desenvolvidas.
Mas… não há bela sem senão… e a vulgarização do automóvel com características médias de 5 lugares, 200 litros de bagageira e 100 cv de potência, saturou as nossas cidades, tornou a circulação difícil, o estacionamento caótico, a poluição preocupante e exagerado o consumo de recursos naturais.
O que inicialmente era utilizado em pequenas viagens familiares semanais por alguns milhares de pessoas, é hoje utilizado diária e individualmente, por milhões.
Porém, os conceitos da sua criação permaneceram: lugares, espaço para mercadorias, potência de tração.
Será compreensível que a viagem diária e individual de ida e volta para o trabalho seja efetuada num carro de características familiares, ocupando mais espaço em circulação, no estacionamento, consumindo mais combustível, poluindo bastante, exigindo mais matérias-primas na sua construção do que, uma viatura de menores dimensões, menor potência, portanto de consumo inferior, com circulação e estacionamento mais fáceis?
Porém, após uma vintena de anos de alguns modelos automóveis com características individuais, sem bagageira, pouca potência e consumos e fácil estacionamento se encontrarem à venda, ainda é mínima a sua penetração no mercado.
Porquê? Condicionada pelo hábito cultural, a evolução nem sempre se propaga com a desejável racionalidade.
Existe uma necessidade social de afirmação, em cada um de nós, impedindo-nos de aparentar dispor de bens de dimensão inferior aos do nosso vizinho.
Apenas tal será feito se, pelas circunstâncias, formos compelidos.
As consequências, no domínio da circulação, da poluição e do esgotamento das reservas naturais, estão agora à vista. E são preocupantes…
Ninguém limitou, ninguém obrigou, ninguém se preocupou com o futuro.
Agora, 2025, as autoridades tentam impossibilitar o trânsito automóvel particular citadino, subtraindo espaço em rodovias para uso exclusivo de bicicletas e trotinetas elétricas... Apesar do vento, frio, chuva e impossibilidade de bagagem mínima... Aparenta ser uma solução de remendo, aproveitada pela quase forçada compra de biciclos a ganâncias circunstanciais...
O automóvel e a sua penetração nas sociedades é apenas um exemplo de toda a tecnologia pré-cibernética.
Em termos gerais, todos os equipamentos mecânicos desenvolvidos entre 1945 e 1980, ao anunciarem maior facilidade e melhor desempenho nas tarefas rotineiras, inundaram rapidamente os lares ocidentais.
É também a ausência de tecnologias de equivalente potencial, que também contribui para o pantâno económico onde a Europa actualmente se encontra.